Compliance para pequenas empresas: por que é possível implantar

Implantar um Programa de Integridade pode parecer complexo. Muitas vezes, ao se deparar com os requisitos mínimos necessários, alguns podem interpretar que somente seria exequível em um contexto de empresas de grande porte, com grande quantidade de “budget” a ser investido.

Ocorre que, hoje em dia, cada vez mais ter um Programa de Integridade é exigência para contratar com a Administração Pública. Há, inclusive, estados da federação, tais como Rio de Janeiro e Distrito Federal, que exigem o Programa de Compliance como requisito para que se possa contratar com os referidos entes.  Essa exigência pode ocorrer, inclusive, para pequenas empresas, as quais muitas vezes apresentam estrutura organizacional menos complexa, reduzido número de funcionários, poucos recursos financeiros para contratação de ferramentas e pessoas, dentre outros limitadores. Fica, então, a questão: como implantar um Programa de Integridade em microempresas e empresas de pequeno porte?  

É preciso ter em mente que o Decreto 8.420, de 18 de março de 2015 (que regulamenta a Lei nº 12.846/2013, que dispõe sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira), em seu artigo 41 e 42, estabelece o conceito e os parâmetros a serem considerados para o Programa de Integridade. Registre-se, aqui, que a referida normativa não determina o modo, a forma de confecção de um Programa de Integridade, limitando-se a estabelecer apenas parâmetros mínimos. A metodologia e a determinação de ações específicas para atender estes parâmetros devem ser adequadas ao porte da empresa, à sua organização, ao seu tipo de negócio, aos riscos previamente levantados, de modo a tornar cada Programa de Integridade o mais personalizado e eficiente possível. Afinal, é a partir da construção de um Programa de Integridade condizente com a realidade e o porte da empresa, bem como com a sua dinâmica, é que será possível ter de fato um Programa de Compliance eficaz e não apenas um amontoado de papel “para inglês ver”.

O próprio Decreto 8.420/15 expressamente estabelece em seu §1º, do artigo 41:

§ 1º Na avaliação dos parâmetros de que trata este artigo, serão considerados o porte e especificidades da pessoa jurídica, tais como:

I – a quantidade de funcionários, empregados e colaboradores;

II – a complexidade da hierarquia interna e a quantidade de departamentos, diretorias ou setores;

III – a utilização de agentes intermediários como consultores ou representantes comerciais;

IV – o setor do mercado em que atua;

V – os países em que atua, direta ou indiretamente;

VI – o grau de interação com o setor público e a importância de autorizações, licenças e permissões governamentais em suas operações;

VII – a quantidade e a localização das pessoas jurídicas que integram o grupo econômico; e

VIII – o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte.

Como se vê, o legislador se preocupou em estabelecer que o porte e as especificidades da pessoa jurídica deverão ser observados, bem como o fato de ser qualificada como microempresa ou empresa de pequeno porte.

Ainda no referido artigo, em seu §3º, o decreto determina que “na avaliação de microempresas e empresas de pequeno porte, serão reduzidas as formalidades dos parâmetros previstos neste artigo, não se exigindo, especificamente, os incisos III, V, IX, X, XIII, XIV e XV do caput”. Ou seja, ao se avaliar o Programa de Integridade destes tipos de empresa, não se exigirá, por exemplo, análise periódica de riscos, instância interna, canais de denúncia, procedimentos e padrões de conduta para terceiros (como fornecedores, prestadores de serviço, etc).  Embora alguns destes requisitos não sejam exigidos, ainda assim há parâmetros que, na medida do possível, devem sim ser aplicados no contexto das pequenas empresas. Um exemplo disto é o Canal de Denúncia, que é instrumento eficaz de monitoramento do Programa de Integridade. A forma como este Canal será implantado deve ser pensada de acordo com a estrutura da própria empresa. Até uma Caixa de Sugestões é válida, assim como um email específico ou formulário, desde que se respeite o anonimato e que se estabeleça uma política de não retaliação de denunciantes.  

A própria Controladoria Geral da União (CGU) elaborou uma Cartilha de Integridade para pequenos negócios. Nesta Cartilha, a CGU apresenta conteúdo consistente e bastante didático para pequenas empresas que estão buscando implantar um Programa de Integridade.

Em resumo, o que se deve ter em mente é que ter um Programa de Compliance é um ingrediente agregador ao negócio, independente do porte da empresa. É possível implantar tal Programa em pequenas empresas, desde que se busque, sempre com o apoio da Alta Administração, alcançar os parâmetros estabelecidos no decreto 8.420/15, por meio de ferramentas, estratégias e ações compatíveis com o porte e estrutura da empresa. O fato é que instituir um Programa de Integridade torna a empresa mais competitiva, além de reforçar sua boa-fé, transparência, confiança e seriedade na relação com seus parceiros de negócios.

“Cada empresa deve criar um programa de integridade que atenda às suas necessidades e aos seus riscos, assim como esteja dentro de seu orçamento. O mesmo deve ser feito pelos pequenos negócios: proprietários, donos e administradores devem estar compromissados com essa ideia de integridade e adotar medidas para prevenir e combater atos de fraude e corrupção, difundir valores que estimulem comportamentos éticos, fortalecer controles internos e buscar outros meios para trazer e viabilizar a integridade nas suas atividades.”  (CGU, Integridade para Pequenos Negócios, 2017. Disponível em: https://www.gov.br/cgu/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/integridade/arquivos/pequenos-negocios.pdf )

  • Artigo elaborado pelos advogados Isabela Veiga e Carlos Eduardo Paletta Guedes.

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